12. JESUS E OS POBRES
Jesus e os Pobres
A vocação profunda, incoercível, livre, de ser útil, de extender a mão no gesto de auxílio, de dizer a palavra de conforto, de participar com o coração das aflições do próximo e tudo fazer para aliviá-las, oriunda desse misterioso sentimento de culpa que nos domina e humaniza, estava pedindo em mim uma satisfação egoística menos intensa em favor de uma satisfação espiritual mais completa.
Foi depois de ler "A Descoberta do Outro" de Gustavo Corção que "fiz a maior descoberta de minha vida: a caridade é um ato de amor ao próximo por amor a JESUS. Esta verdade velha de 2000 anos passou centenas de vezes pelos meus olhos e pela minha inteligência. Mas o meu coração veio a descobri-la não faz mais de meia duzia de anos.
Se o que fazemos pelo próximo não o fizermos por Jesus, vale imensamente para o próximo mas para a salvação de nossa alma vale muito pouco. Se não identificamos a Jesus no próximo cuja miséria nos subjuga o coração e clama pelas nossas mãos no amorável gesto de auxílio, não fazemos mais do que monologar com as nossas próprias sombras, no encalço de uma mesquinha paz interior, sem sentido porque destituída do seu verdadeiro objeto. A consciência da presença sobrenatural de JESUS na miséria do próximo, que tão vivamente
nos excita à piedade e impele ao amoroso gesto de ajuda, completa a relação
moral em que, na verdade, nós passamos de sujeito a objeto da caridade.
Quando penetrei pela primeira vez na pequena e mal iluminada sala de reuniões da Conferência da Imaculada Conceição e roguei humildemente que me admitissem como noviço, não fiz mais do que seguir o caminho de minha caridade que procurava a JESUS, que não se satisfazia mais consigo própria, que estava na iminência de deixar de ser minha para ser de JESUS. A caridade vicentina sempre me fascinou. Ingressar na admirável Sociedade era o mesmo que me integrar na tradição de mais de três séculos de amor ao próximo, de caridade ativa, espiritual e material, de ajuda efetiva aos necessitados, aos abandonados, aos pobres e miseráveis de todo o mundo, e tudo fazer obscuramente, humildemente, com Jesus e por Jesus.
Depois de quasi dois anos de atividades vicentinas ainda não consegui libertar a minha caridade do plano terreno e integrá-la no plano divino, tornando-me a mim mesmo um pobre de Jesus, mas estou no caminho certo, tenho peja frente um fim perfeitamente nítido a alcançar. E, o que é importante para socorrer-me na minha fraqueza, milhares de vicentinos seguem o mesmo caminho e lutam pelo mesmo fim. O que dantes era fácil e superficialmente agradável tornou-se árduo e difícil mas profundamente pacificador. Passei de ajudador a ajudado, de socorrista a socorrido, de sujeito a objeto de caridade, de provido a necessitado. Sim, imensamente mais necessitado de JESUS do que os pobres que assisto.
Os que vêem os pobres em si, ajudam porque temem a pobreza; é um modo de afastá-la e de sentir-se menos culpado. São melhores do que aqueles que não vêem os pobres e cultivam displicentemente o automatismo filantrópico. Mas os que se vêem nos pobres e neles procuram a JESUS, esses estão, na verdade,
fascinados pela pobreza, pela dignidade da pobreza, pela pacificadora equidade da pobreza. De uma coisa nós vicentinos estamos certos: quando a pobreza conquistar o mundo, não haverá mais lugar para a miséria, esse mal espantoso que o tecnicismo do século XX pode adjudicar-se como uma das suas mais extraordinárias conquistas.
Ninguém irá a Jesus senão pelo caminho da pobreza. Ninguém será recebido no Céu se não levar pelas mãos um pobre de JESUS que por nosso esforço ascendeu da miséria à pobreza.
Comentários
Postar um comentário